Tratar Iguais os Diferentes? Um Olhar sobre Justiça e Democracia
A democracia que tanto defendemos corre um risco real quando permitimos que o clamor por punição supere a racionalidade

Nos últimos dias, as redes sociais têm sido bombardeadas com debates acalorados sobre o julgamento dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro. A narrativa que se desenha parece seguir um roteiro já estabelecido, onde cada peça do tabuleiro se move conforme um cronograma cuidadosamente planejado. Afinal, quando um governo se vê imerso em crises e sua popularidade declina, é necessário um grande fato político que desvie o foco da opinião pública.
O que, porém, mais entristece nesse cenário não é apenas o espetáculo político, mas a forma como a sociedade tem reagido. A cada dia, multiplicam-se nas redes sociais os clamores por punição irrestrita, traduzidos na frase que se tornou um verdadeiro grito de guerra: "Anistia, não!" O que muitos parecem esquecer é que, entre os que estão sendo julgados, há cidadãos comuns—senhoras, senhores, jovensque foram às ruas sem portar armas, sem representar uma ameaça direta ao sistema democrático.
Que fique claro: aqueles que depredaram patrimônio público, que recorreram à violência e que atentaram contra as instituições devem, sem dúvida, responder pelos seus atos. A democracia exige que se puna a desordem e qualquer tentativa de subversão da ordem constitucional. No entanto, será que estamos, de fato, aplicando a justiça de maneira equitativa?
É justo condenar com extremo rigor quem rabiscou uma estátua com batom enquanto criminosos que devastam vidas seguem impunes? Se a lógica for essa, então por que não aplicamos o mesmo critério aos pichadores de nossas cidades? Por que não vemos o mesmo clamor por justiça quando traficantes seguem soltos, minando o futuro de milhares de famílias? O Direito nos ensina que “tratar desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades” é um princípio fundamental da justiça. Aplicar sanções desproporcionais, ignorando as nuances de cada caso, não é justiça é "vingança" travestida de legalidade.
A democracia que tanto defendemos corre um risco real quando permitimos que o clamor por punição supere a racionalidade. Hoje, muitos negam a anistia e bradam por condenações severas. Amanhã, poderão ser eles os que imploram por clemência. O tempo é implacável e a roda da história não cessa de girar. Quando perceberem, a Inês já será morta.
Que esse texto sirva para provocar reflexão. Que a sede por justiça não se transforme em sede por vingança. Porque, acima de tudo, a vida exige coragem.
Por Hamillton Vale
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