O Preço da Incoerência: Quando a Corrupção se Torna Barganha Política
Em Várzea Alegre, não basta aderir – é obrigatório se expor. Há uma exigência velada de que, diariamente, sejam feitas postagens em defesa daqueles que prometeram barganhas
A política brasileira, ao longo das últimas décadas, tem sido um campo minado pela incoerência e pelo pragmatismo rasteiro. Em Várzea Alegre, as eleições de 2024 trouxeram à tona um fenômeno que é, ao mesmo tempo, intrigante e preocupante: o abandono dos ideais por parte de muitos que antes se apresentavam como paladinos do combate à corrupção.
É inegável que, em 2018, Jair Bolsonaro ascendeu ao poder com um discurso centrado na moralidade, prometendo expurgar da política nacional os velhos esquemas de compadrio e desvios. Muitos de seus eleitores eram pessoas que, com veemência, afirmavam jamais compactuar com políticos e grupos associados à corrupção. No entanto, bastaram algumas promessas e favores eleitorais para que parte desses mesmos cidadãos abandonassem seus princípios.
A dinâmica observada em Várzea Alegre revela um movimento paradoxal: antigos defensores da ética sucumbiram às pressões da pragmática política local. Promessas de empregos e, em casos mais graves, relatos de distribuição direta de dinheiro transformaram o voto – outrora um instrumento de esperança – em uma mercadoria negociada sem constrangimento. Aqueles que antes vociferavam contra a corrupção hoje se dobram à mesma lógica que combatiam, em um ciclo que perpetua as práticas que juraram repudiar.
Em Várzea Alegre, não basta aderir – é obrigatório se expor. Há uma exigência velada de que, diariamente, sejam feitas postagens em defesa daqueles que prometeram barganhas. Sem essas demonstrações públicas de fidelidade, não se é visto, não se é lembrado e, consequentemente, corre-se o risco de perder a posição no jogo de interesses. Esse comportamento reflete um sistema de vigilância simbólica, onde o silêncio é interpretado como traição e a lealdade se mede pela quantidade de curtidas e compartilhamentos.
Esse tipo de comportamento não é apenas contraditório; é também devastador para a democracia. Quando cidadãos comuns, os principais agentes da transformação social, se rendem ao fisiologismo, a mensagem enviada é de que os princípios são maleáveis e que os valores podem ser postos à venda diante da primeira oportunidade de vantagem pessoal.
Mas o que explica essa mudança tão radical de postura? Em parte, o desencanto com a própria política nacional e a constatação de que muitos dos que se apresentaram como “novos” na verdade reproduzem as mesmas práticas dos velhos políticos. Outro fator é a vulnerabilidade econômica, que transforma a promessa de emprego em uma moeda de troca poderosa. Por fim, há também uma questão cultural: a naturalização do “jeitinho”, da conveniência e do apadrinhamento como formas de sobrevivência.
Essa situação, contudo, não pode ser encarada com resignação. É fundamental que se recupere o debate sobre ética na política, mas também que os cidadãos sejam chamados à responsabilidade. Não basta cobrar integridade dos outros – é preciso praticá-la no dia a dia, inclusive nas escolhas eleitorais.
Várzea Alegre é um microcosmo do Brasil, refletindo a fragilidade de nossos valores democráticos e a urgência de uma sociedade mais consciente. Que essa eleição sirva como um alerta para que deixemos de tratar a corrupção como algo que acontece apenas no alto escalão e passemos a reconhecer que ela também se manifesta nas pequenas escolhas do cotidiano. Afinal, o combate à corrupção começa no momento em que decidimos ser fiéis aos nossos princípios – mesmo quando isso não nos traz vantagens imediatas.
Por: Capitão Horizonte